quarta-feira, 7 de março de 2012

Uma nova realidade para as empresas de Contact Center

Utilização de multicanais, nova lei do trabalho à distância, preocupação com o índice de escolaridade, reajuste salarial... As empresas e seus colaboradores estão preparados para este novo cenário? 
 
Marcelo Brandão
 




No passado o colaborador de uma empresa de contact center era visto como um profissional de passagem, aquele emprego temporário que serve para “tapar buraco” até que algo melhor aparecesse. Além disso, a profissão de telemarketing, para muitos, ainda é uma porta de entrada para o mercado profissional. Porém, em um país em plena ascensão econômica, e com um consumo interno pujante, a busca pela excelência no atendimento ao cliente tem se tornado uma constante, e requer rapidez e eficiência.

Isso tem tirado o sono de muitos CIOs pelo País e faz com que as empresas do setor de contact center repensem suas estratégias e os seus modelos de trabalho. Por outro lado, jovens que buscam sua primeira oportunidade de trabalho, ou até mesmo, dão o primeiro passo rumo à profissão almejada, precisam estar mais bem preparados para esta nova realidade, que pode lhe proporcionar ganhos a curto e a longo prazo.

Diante deste crescimento, especialistas apontam que a nova realidade do setor passa por mudanças significativas, o que pode levar ao remodelamento das suas formas de trabalho.

Prova disso é a recente regulamentação do trabalho à distância. Estimativas apontam que o teletrabalho deva crescer 30% ao ano por conta da nova regra, o que proporcionaria um aumento de profissionais beneficiados pela mobilidade - até mesmo a contratação dos que sofrem algum tipo de deficiência motora deverá aumentar.

Na análise de Álvaro Mello, professor da Business School São Paulo e presidente da Sociedade de Teletrabalho e Teleatividade (Sobratt), a nova regra está começando a alterar os modelos de gestão das empresas. “A lei 12.551 impacta as empresas pelo fato de que agora passa a existir o teletrabalhador, anteriormente desconsiderado como categoria de profissional. É um bom sinal, pois significa que esta atividade já começa a ser regulamentada”.

Empresas como a Teletech já se beneficiam deste modelo fora do Brasil e agora planejam atuar dessa maneira por aqui. Para Agnaldo Souza, diretor de RH da companhia, “a minimização de espaços físicos nas dependências da empresa já resultaria em alguma economia”, diz.

Ainda deve-se discutir muito esta nova regulamentação que poderá abrir inúmeras distorções se não for acompanhada de perto. Outro fator importante neste momento é a análise das características deste novo profissional, fundamental para o desenvolvimento efetivo do setor. E as novas formas de gestão e monitoramento de trabalho que devem ser adotadas o mais rápido possível.

Para Stan Braz, diretor presidente executivo do Sintelmark (Sindicato das Empresas de Telemarketing, Marketing Direto e Conexos) e da ABRAREC (Associação Brasileira das Relações Empresa-Cliente), as empresas devem estar atentas para esta nova realidade. “Precisamos de novos operadores e de uma gestão mais inovadora. O que pode ocorrer por meio de cursos de aperfeiçoamento para ambos. Isso fará com que o contact center esteja focado em suas necessidades e do setor que atendem. Nesse momento o RH destas empresas é fundamental nessa evolução”.

Realmente, uma equipe de Recursos Humanos inovadora e atenta às características que se enquadram ao perfil da vaga ofertada pela companhia faz toda a diferença neste novo cenário. Porém, em um país onde o governo não investe em educação básica, a contratação de um jovem para o mercado de teletrabalho acaba sendo uma tarefa herculana.

Mesmo com 400 mil profissionais, somente no estado de São Paulo, com previsão de abertura de 32 mil novas vagas, dados do próprio Sintelmark, o perfil do operador de contact center atuante consta que dois em cada dez profissionais cursam ensino superior.

A saída, segundo o próprio Braz, seria “a priorização do governo na educação básica”. Sem dúvida, que um jovem melhor instruído chegaria com melhores chances de contratação, galgaria rapidamente melhores posições na empresa e, mesmo que houvesse o eterno rodízio de operadores, seu desempenho poderia ser muito melhor aproveitado em um curto espaço de tempo, resultando em um melhor atendimento ao consumidor.

“As organizações tendem a promover internamente os funcionários que se destacam, antes de anunciarem as vagas externamente, por entenderem que estes jovens já demonstram confiança, comprometimento e competência nas funções que exercem. Para quem quer evoluir dentro da empresa estar melhor preparado é um diferencial”, comenta o executivo.

Salário X Formação

Hoje, para os operadores de contact center com jornada de seis horas diárias, o piso salarial passou de R5 450,00 para R$ 630,00, um aumento de aproximadamente 16%. O piso para supervisores de operação é de R$ 1.100,00, segundo informações do Sintelmark.

Muitas empresas no Brasil já oferecem salários superiores a R$ 1.200, 00 para um operador bilíngue, mas a dificuldade de se encontrar este profissional no mercado ainda é grande.

Para termos uma ideia, as empresas de contact center no Brasil investem 7% de seu faturamento em tecnologia e capacitação como o aperfeiçoamento da própria língua portuguesa, tamanho é a deficiência oriunda do nosso ensino básico.

Em contrapartida precisam ter resultados rápidos. É aí que reside o maior dilema: como recuperar um jovem com um déficit de escolaridade de anos, em 42 dias - tempo médio que as empresas de contact center têm para se treinar um novo colaborador?

Nessa hora entra o conhecido “script”, técnica utilizada durante anos para formar o discurso destes operadores, mas, que se torna ineficiente diante da nova realidade proporcionada pelos multicanais de atendimento.

Para Stan Braz, o Brasil é uma grande potência neste setor, mas falta investimento em educação básica. “Não podemos inflacionar o colaborador. Não podemos oferecer um salário de R$ 2.000,00 para quem está chegando ao mercado de trabalho. Na Índia, na China o governo investe na educação e lá um operador de telemarketing rapidamente evolui. Com certeza ele poderá vir a ser um engenheiro de TI. Aqui no Brasil isso é quase impossível, poucos se sobressaem”, argumenta o executivo.

Tendência para os próximos 2 anos

O relacionamento multicanal já é uma realidade. Hoje, nosso primeiro passo para sanar uma dúvida ou especular sobre um determinado serviço tem como fonte de consulta a internet. A mobilidade já está inserida também neste relacionamento. Por intermédio de smartphones e tablets o consumidor opta por outras vias, que não a linha telefônica, para entrar em contato com as empresas. O que realmente falta são profissionais de teletrabalho preparados para lidarem com este novo modelo de relacionamento e as novas formas de convergência.

Especialistas já apontam que por conta destes avanços tecnológicos, da inclusão digital e, agora somada, a nova regra de trabalho à distância, o relacionamento com as empresas por meio de multicanais deverá crescer 20% até 2013. Esse crescimento aponta uma tendência: as empresas poderão centralizar na telefonia suas operações e através dos multicanais (chat, email, rede sociais) focarem com mais dinamismo e competência o seu atendimento.

É o que o especialista Daniel Domeneghetti, sócio-fundador da E-Consulting chama de Relacionamento MCC: Mobilidade, Convergência e Colaboração. “Os contact centers têm que preparar seus funcionários para trabalharem com isso. Já vivemos esta nova forma de relacionamento”, afirma.

Para Stan Braz, é um momento de expansão em todas as esferas da sociedade e o teletrabalho é um reflexo dessa nova fronteira. “A formação empresarial no Brasil ainda é de indústria. Toda essa mudança que está acontecendo impacta os serviços, um setor que ainda estamos adaptando aos novos tempos. Não só isso. Nossas normas ainda não estão adaptadas, nossos marcos regulatórios são da década de 40... Isso tudo tem que ser revisto também”, argumenta.

Enfrentamos uma dura realidade: existe um maior consumo por parte da sociedade que busca um melhor atendimento; discutimos salário e a falta de mão de obra qualificada; e as empresas vivem um momento de expansão e oportunidades.

Encontrar a equação certa, talvez resida em novos planos de educação, em parcerias com empresas privadas e um olhar mais atento do governo federal para um problema que se estende por décadas: educação básica de qualidade.

Quem sabe em um futuro distante, a qualidade da nossa educação caminhe com a mesma velocidade que a nossa economia que, hoje, atrai novos investimentos. Afinal, não podemos nos esquecer: por de traz de um telefone, ainda existe um ser humano.