sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Governo de Minas é pioneiro na gestão de recursos humanos com valorização da meritocracia e qualificação de gestores

Fonte: Vívian Soares – Valor Econômico

Empresas públicas e governos usam estratégias de RH da iniciativa privada

Com o Choque de Gestão, o Estado deu o primeiro passo para medir de forma mais eficiente a produtividade de seus servidores. Desde 2005, o governo avalia a atuação de 220 mil funcionários anualmente – e os resultados definem a progressão na carreira e o direito a bônus

Consagradas pela iniciativa privada como símbolos de eficiência em gestão de pessoas, ferramentas como avaliação de desempenho, remuneração atrelada a metas e plano de carreira começam a fazer parte das estratégias do poder público no Brasil. Nos últimos anos, governos e estatais têm seguido bons exemplos das empresas, adaptando esse aprendizado à realidade do setor.

A prática mais comum tem sido vincular o pagamento de bônus a metas pessoais ou institucionais. “Enquanto nas empresas o prêmio pode estar relacionado ao lucro, na administração pública os objetivos são outros, como melhora da qualidade do ensino ou aumento de arrecadação”, diz Marcelo Douglas de Figueiredo, gestor governamental do Ministério do Planejamento.

A maior dificuldade para os governos, segundo ele, é mensurar os resultados. “Avaliar desempenho nesse setor é complicado. Os critérios muitas vezes são subjetivos e relacionados a questões comportamentais ou intangíveis”, afirma.

Foi com o desafio de definir e desenvolver as competências básicas para os principais cargos de gestão que o Estado de Minas Gerais deu o primeiro passo para medir de forma mais eficiente a produtividade de seus servidores. Desde 2005, o governo avalia a atuação de 220 mil funcionários anualmente – e os resultados definem a progressão na carreira e o direito a bônus. Porém, essa iniciativa do “choque de gestão”, programa que introduziu o conceito da meritocracia, precisou vir acompanhada da qualificação dos gestores. “Percebemos que eles muitas vezes tinham conhecimento técnico, mas pouca capacidade de gestão”, explica a subsecretária de planejamento Fernanda Neves.

Em parceria com a Fundação Dom Cabral, o Estado começou a identificar em 2007 as principais competências necessárias nesses profissionais e encontrou vários pontos de contato com o setor privado. Habilidades como visão sistêmica, liderança de equipes e orientação para resultados foram privilegiadas em um curso de capacitação ministrado a 2.200 servidores de médio escalão. “A qualificação dos gestores é essencial para conseguirmos eficiência nas avaliações dos servidores”, afirma. O governo pretende estender o projeto à alta administração a partir do ano que vem.

Na Prefeitura de Curitiba (PR), a estratégia de motivar os servidores não passou pela vinculação de metas institucionais à remuneração. Carlos Homero Giacomini, secretário de planejamento e coordenação e presidente do Instituto Municipal de Administração Pública (Imap), afirma que não existem evidências de que esses incentivos aumentem a eficiência. “Prova disso é que conseguimos ir bem na execução das metas sem atrelar os objetivos institucionais aos salários”, justifica.

Por outro lado, a prefeitura vem implementando programas de qualidade desde 2008. Segundo Giacomini, todos os 33 mil funcionários têm seu desempenho medido em um processo inspirado no modelo “360º”, amplamente adotado na iniciativa privada. Nele, os profissionais são avaliados por chefes, colegas e até mesmo pela comunidade. Segundo o secretário, a ferramenta facilita o crescimento de carreira do profissional e também seu plano de desenvolvimento de competências de longo prazo.

De acordo com Djair Picchiai, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV/SP), esses são indicadores qualitativos melhores para a gestão de pessoas na área pública, mas o componente salarial não pode ser subestimado. “O incentivo material, se trabalhado em conjunto com outros aspectos de desenvolvimento pessoal, promove mais sinergia e engajamento”, afirma.

A qualificação dos servidores, porém, é ainda um dos maiores entraves para o aumento da eficiência do setor público, especialmente no âmbito municipal. “É essa ponta da administração pública que tem contato mais direto com a população, mas também é a mais despreparada e mal remunerada”, afirma Marcelo Figueiredo, do Ministério do Planejamento. A solução, segundo ele, deve passar necessariamente por programas de educação formal.

Em Curitiba, a alternativa encontrada foi estimular os servidores a fazer cursos de educação continuada, com subsídios que chegam a 70% do valor da mensalidade. O município também promove cursos de curta duração gratuitos e ministrados durante o horário de trabalho. “A meta é que os funcionários participem de pelo menos um programa por ano”, afirma Giacomini. As boas práticas da gestão, em sua opinião, são inspiradas no setor privado, mas também nas empresas públicas consideradas “ilhas de excelência”, como as do setor de petróleo e energia.

A Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) é um exemplo. Com 5.600 funcionários, a estatal, que atua em sete regionais no Nordeste, desenvolveu ferramentas como plano de carreira e distribuição de cargos baseado em competências. Um dos objetivos é atrair talentos em um mercado competitivo. “O setor de energia tem uma realidade específica, onde empresas públicas concorrem com instituições privadas. Além dos leilões, disputamos também a mesma mão de obra, formada basicamente por técnicos e engenheiros”, diz Antônio Varejão, superintendente de RH da Chesf.

Uma das estratégias para combater esse problema, segundo ele, é oferecer uma política de benefícios agressiva e inovar na gestão de cargos, mesmo com a exigência de contratação mediante concurso público. Após efetivado, o funcionário tem suas características comportamentais avaliadas e é alocado em uma área mais próxima de seu perfil. “Dar a esse colaborador a chance de atuar em uma função com a qual tem mais afinidade é um grande passo para retê-lo”, diz.

Djair Picchiai, da FGV, acredita que o formato padronizado dos concursos dificulta a avaliação comportamental dos profissionais, mas não impede que os perfis pessoais sejam levados em conta no momento de direcioná-los ao trabalho. “Assim como acontece nas empresas, o setor público também precisa valorizar as particularidades de cada funcionário para promover o engajamento”.

Na Chesf, a adaptação do servidor é analisada trimestralmente no primeiro ano, mas o acompanhamento não se restringe à fase inicial. Depois desse período, há avaliações periódicas de competências, que podem indicar cursos e treinamentos necessários para a progressão na carreira. Um dos ganhos com essa estratégia, de acordo com o superintendente, foi a redução do ‘turnover’. “O índice de desligamento de novos funcionários, que foi de 20% entre os admitidos no concurso de 2002, caiu para 6,5% no de 2008″, compara.